O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Voltei — Irmão Jacob


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No templo

(Sumário)

1. Além da morte situam-se as Esferas da continuidade.

2 Se o homem comum conseguisse deter o curso dos pensamentos de segunda ordem, durante alguns minutos por dia, de modo a refletir na grandeza da vida, sondando as realidades da morte, certo evitaria as algemas do mal que o agrilhoam às recapitulações expiatórias.

3 Aqui, permanecemos articulados em nossas próprias criações, tanto quanto as peças de determinada máquina a ela se ajustam para o necessário funcionamento.

4 Quem se aflija na escassez de possibilidades materiais ou na angústia de tempo, faça o bem mesmo assim. 5 Quem se lamenta no cativeiro do crime, esforce-se por fugir-lhe às garras, dedicando-se ao socorro dos semelhantes. 6 Quem se demora no sono do vício, louve a mão áspera que o desperta e levante-se para a caridade regenerativa.

7 Cada dia que passa para o homem encarnado parece gritar-lhe aos ouvidos: — Ainda é tempo! Ainda é tempo!

8 Dirige-nos a morte para os objetivos que procuramos.

9 Os ditadores da crueldade têm sob o próprio mando não somente os servidores que se corporificam na Terra, mas também os assalariados invisíveis que lhes estimam os propósitos inferiores. 10 O homem que se transforma em instrumento da bondade e da salvação, ainda que o não saiba, recebe o concurso de muitos irmãos interessados nos serviços de elevação própria.


EM PREPARO


2. Depois de prolongadas meditações, alcançáramos o dia em que eu seria recebido no grande templo.

2 Marta e os amigos providenciaram todas as medidas suscetíveis de me intensificarem a felicidade.

3 Crianças do parque transportaram enormes braçadas de flores, alvas como neve, e em nossa ditosa casa música elevada se fez ouvir por várias horas, advertindo-me a filha querida no sentido de manter a mente distanciada de todas as preocupações alusivas à experiência física.

4 Seria abraçado por muitos amigos, traçaria novas diretrizes para a luta e a preparação adequada constituía-me dever, — informou a filha bondosa.

5 Antes da hora prevista, Andrade veio até nós, avisando-me que à noite, efetivamente, solucionaria meu problema de trabalho. Reencontraria muitos companheiros, mas eu longe estava de imaginar que reveria a maior parte dos próprios Espíritos com os quais havia convivido pessoalmente nas sessões e serviços realizados na Terra.


EM PLENO SANTUÁRIO


3. À noite, quando as constelações se derramavam no céu muito azul, todos nós, em alva roupagem, tomamos o caminho do santuário.

2 No átrio fulgurante, esperavam-me muitos amigos do Espiritismo brasileiro. Estenderam-me os braços e, não obstante envergonhado por não possuir um halo brilhante, enquanto eles todos se mostravam envolvidos em auréolas luminescentes, penetrei o interior.

3 Subimos, subimos, até que, num salão adornado e amplo, vários irmãos que eu não conhecia me receberam generosamente.

Talvez inspirado por Marta, admirável grupo orquestral executou a ouverture de “La Gazza Ladra”. de Rossini.

4 Com que emoção acompanhei a peça vazada em suave encantamento! Que saudades do meu antigo lar terrestre! A esposa e as filhinhas, educadas na elevada compreensão da arte divina, estavam vivas, dentro de mim… Que imenso o desejo de reuni-las de encontro ao peito e demorar-nos, assim, unidos em espírito, eternamente!

Não contive as lágrimas copiosas.

5 Cessada a melodia, extenso grupo coral de meninos-orientadores entoou formoso hino intitulado: “O Irmão que volta de longe”.

Apesar da palavra amorosa de Bezerra, de Guillon, de Cirne e de Marta, eu nada podia responder. Alguma coisa me entravava a garganta. 6 Sentia-me criança, de novo. Na tela da memória, revia minha abnegada e valorosa mãe, como se estivéssemos na Europa distante. Sentia-lhe o abraço carinhoso e ouvia-lhe a voz, às despedidas:

— Vai, meu filho! Trabalha dignamente, sê bom para Deus e para os homens! Um dia, ver-nos-emos, de novo, no lar…

7 Fitava as crianças a me sorrirem cantando, escutava os companheiros estimulando-me ao bom ânimo, reparava o ambiente doce e festivo, emoldurado em filigrana radiosa, e perguntava a mim mesmo se aquele não era o lar divino a que minha mãe se referia em meus dias de infância…

8 Centenas de entidades congregavam-se em torno, respeitosas, e ao fundo uma centena de Espíritos singularmente iluminados se mantinham em profunda concentração. Andrade mostrou-mos e esclareceu:

— Aqueles são vanguardeiros da pureza e da sabedoria, que fornecem fluidos para materializações de ordem sublime.

9 Não consegui enunciar a impressão que me causavam, em vista do pranto a embargar-me a voz. Entretanto, notei que ao lado deles vasta câmara lirial se prolongava, além, na parte da torre que ocupávamos.

10 Das janelas próximas, dominava grande parte da cidade com o olhar, maravilhando-me a contemplação da noite pacífica e formosa, repleta de harmonia e de luz.


NOVA FAMÍLIA DE SERVIÇO


4. Possivelmente com o objetivo de arrebatar-me à extrema emotividade em que me envolvera, o Irmão Andrade conduziu-me a largo recanto do recinto, apresentou-me algumas dezenas de companheiros tão obscuros quanto eu mesmo e explicou:

— Aqui, Jacob, se alinham os cooperadores do seu trabalho edificante, que prosseguirá mais ativo.

2 Choveram abraços de alegria e camaradagem.

Reconheci muitos deles, que haviam partido anos antes de mim.

Surgiu a conversação jubilosa e discreta. Alguns indagavam de meus derradeiros serviços doutrinários. Muitos se reportavam aos nossos encontros e reuniões em variados pontos do Rio. Diversos médiuns de meu conhecimento aí apareciam.

3 A nota predominante na palestra era a esperança no futuro.

Lastimavam todos, qual ocorria a mim mesmo, não haverem aproveitado as horas no corpo físico, dentro da eficiência desejável. Poderíamos ter concretizado muito mais o nosso idealismo cristão na causa que abraçáramos, se tivéssemos usado a aplicação com o mesmo ímpeto com que procurávamos conforto no campo do ensinamento.

4 Enfermos em cujo tratamento cooperara, através de passes, enalteciam a fé com que se haviam separado da carne e exprimiam o júbilo com que aguardavam a possibilidade de auxiliarem os entes queridos, ainda presos aos Círculos terrestres.

5 Dentro de meu ser vibravam incentivos novos.

Não merecia semelhantes demonstrações de confiança e apreço, mas reaprenderia as lições e, se as autoridades superiores nos permitissem a congregação para o serviço útil, poderiam contar com as minhas energias apagadas e humildes.

6 Certo velhinho, que se afirmava assistente de meus trabalhos em Botafogo, informou-me de que muitos dos presentes eram elementos evangelizados em nossas próprias reuniões e preces. A maioria fora trazida de múltiplos lugares, depois de longas tarefas e provas de reajustamento, a fim de juntos recomeçarmos o trabalho.

7 Elucidou Andrade que eu poderia continuar repousando ao lado de Marta por mais tempo, e que no instante oportuno mobilizaria o grupo na assistência fraterna a que me dedicara nos últimos anos da experiência carnal, para que a desencarnação não me impusesse intervalo ruinoso às atividades.

8 Abracei os companheiros, um a um, extremamente comovido, e expliquei que não iriam trabalhar comigo e, sim, eu próprio é que seria colaborador deles. Seríamos um conjunto de servos do bem, procuradores da luz no serviço digno. Constituiríamos uma só família, em nome do Eterno Amigo e Nosso Senhor Jesus.


MOMENTOS DIVINOS


5. Voltando à presença de Guillon e de outros amigos, reparei que o silêncio se fez profundo e indefinível.

2 Bezerra, nimbado de intensa luz, tomou lugar entre a grande assembleia e o conjunto de irmãos que oravam extáticos, e alçou ao Mestre Divino sentida prece.

3 As palavras dele caíam-me na concha do coração quais fagulhas dum fogo celeste a sacudir-me as fibras mais íntimas, sem destruí-las.

Rogava, magnânimo, a Jesus me fortalecesse e me inspirasse, dentro do novo ministério.

4 Tão excelsas eram as expressões da súplica que estranho fenômeno se produziu ante meus olhos assombrados.

5 Ao toque da oração, os amigos iluminados se fizeram mais radiantes e mais belos e as flores do recinto, como que nimbadas de oculto esplendor, passaram a irradiar maior brilho.

6 As lâmpadas, ali, eram as almas inflamadas de amor e a claridade a derramar-se, intensificada e divina, não alarmava o coração.

7 Pétalas de fluidificada substância azul começaram a cair sobre nós, portadoras de delicado aroma, e se desfaziam, de leve, em nossa fronte, como se obedecessem ao amoroso apelo formulado pelo sublime irmão.

8 Marta amparava-me, porque as lágrimas de ventura, embora tranquilas, me faziam vergar, abatido e trêmulo…

9 Quando Bezerra terminou, oh intraduzível maravilha!

Na câmara alva surgiu, de repente, uma estrela cujos raios tocavam o chão. Tão comovedoras vibrações se espalharam no recinto que não suportei a companhia dos iluminados.

Afastei-me instintivamente para a faixa a que se recolhiam os companheiros de organização opaca.

10 Marta seguiu-me, simbolizando um anjo guardião pressuroso e terno, e, lembrando a hora em que a vi, carinhosa e linda, nos serviços de materialização do Pará, em 1921, enquanto eu ainda vestia a carne física, ajoelhei-me, humilde, no que fui por ela acompanhado.

11 Guillon e os outros me fitavam com lágrimas, e contemplando a estrela que começava quase imperceptivelmente a tomar forma humana, gritei, em pranto, que eu não era digno daquelas manifestações de apreço e nem merecia a visita divina que principiava a revelar-se. 12 Fortalecido por sobre-humana coragem, confessei minhas faltas e salientei meus defeitos, em alta voz, abertamente, sem omitir erro algum.

13 Declarei que, por mim, falava a sombra em que me envolvia e afirmei que não devia ser examinado por amigo e, sim, julgado na qualidade de réu, passível de justa condenação.

14 Comovidos talvez pela exaltação a que me entregara, Guillon, Sayão, Cirne e Schutel deixaram a posição que ocupavam, vieram ter conosco e, reerguendo a mim e Marta, emocionados, sustentaram-nos, de pé, nos braços desvelados e amigos.


Irmão Jacob



Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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